Podemos
alegar que nos períodos de crise há mais que fazer do que emendar a
constituição. Mas todos os períodos são mais ou menos de crise. A constituição
é o texto jurídico mais importante que temos e, entre outras coisas, prescreve
a forma de nos governarmos. Por isso temos o dever de a melhorar. E estamos
sempre a tempo de o fazer.
As
formas de governação democrática observam princípios de separação de poderes e
é assim que deve ser: poder legislativo, poder executivo e poder judicial, e
ainda outros poderes.
Em
Portugal o poder legislativo e o poder executivo não se encontrarem suficientemente
separados e isso é fonte de inúmeros erros, equívocos e prepotências.
- O
poder legislativo e o poder executivo não se encontram suficientemente
separados? Como assim?
A
constituição diz que se realizam eleições legislativas e que o primeiro
ministro deve ser o líder do partido mais votado (salvo circunstâncias
especialíssimas, ponderadas pelo Presidente da República). Assim, temos uma
mesma vontade, um mesmo poder, a conduzir tanto a ação legislativa como a ação
executiva. Por força da lógica partidária, o parlamento é levado a aprovar leis
que interessam a quem governa. O governo é levado a governar no sentido que
interessa a quem legisla. Onde está então a separação? Não está em lado nenhum.
Ao
poder executivo pede-se que governe bem.
Governar
bem é administrar, para o bem comum, os meios e as expectativas disponíveis e
ainda criar novos meios e novas expectativas, sempre dentro do cumprimento das leis. O governo não existe
para fazer leis, mas para cumprir as leis e para fazê-las cumprir.
Ao poder legislativo pede-se que crie boas leis.
Seja
qual for a sua orientação ideológica ou mesmo partidária, o parlamento deve
fazer boas leis. As boas leis são leis estruturalmente corretas, num sentido
platónico - são leis gerais, são simples, sem serem simplistas e, acima de tudo,
são poucas. Além disso, uma boa lei não deve apenas aplicar-se a todas as
pessoas no presente, mas também deve ter uma preocupação de perdurar no tempo.
Uma boa lei precisa de ter uma ambição de universalidade não só quanto
aos seus sujeitos - todas as pessoas - mas também quanto ao seu tempo de
aplicação - a sua longevidade.
Governar
e legislar são coisas separadas.
Parece-me
claro que o momento da eleição dos deputados deveria ser diferente do momento
da eleição do primeiro-ministro. E que a eleição do primeiro-ministro deveria
emanar de uma raiz diferente da do parlamento.